Wednesday, December 30, 2009

2009

Dezembro de 2008 foi muito pesado para mim. Deus, parecia que não iria acabar nunca! Tanta coisa aconteceu, tantos sentimentos novos, estranhos, confusos, muito trabalho, pouco sono, cansaço físico e mental, muita coisa nova pra assimilar... Foi assim que comecei 2009: olhando pro céu, pedindo pra Deus desembolar a minha rabiola.

O ano começou. Em janeiro, pensando em tudo que havia acontecido, escrevi atrás de um postal para mim mesma a seguinte reflexão:
Descobri que o mundo nem sempre é talvez.
Não para tudo.
Não toda hora.
Tem vezes, e coisas.
Que a gente bem tem vontade.
Ou não.
Agora, em dezembro de 2009, li novamente esse postal e entendi que essa reflexão acabou me guiando por todo o ano. Comecei a descobrir e a encarar todas as coisas que eu bem tinha vontade, tentando afastas o "talvez" sempre que possível. Não dava mais pra aguentar frustrações, como uma prisão que eu imponho a mim mesma, a troco do quê? Para levar uma vida mais simples? Quem disse que tudo deve ser simples?

Foi difícil descobrir em mim certas coisas que eu não esperava... e assumi-las. Foi difícil tentar me concentrar em algo quando toda minha mente e corpo queria se jogar para outra coisa. Foi difícil ter que passar por situações pelas quais eu já tinha passado, guardadas as devidas proporções. Foi difícil mas eu sei que elas vão me ensinar alguma coisa, eu quero que ensinem algo, para que nada seja em vão.

2009 foi heavy-metal-thunder, mas de alguma maneira tenho mantido a sanidade, e espero continuar assim. Preciso matar a ansiedade, pois nada ainda está resolvido, mas preciso continuar andando. Acho que nunca estive tão perdida, ou consciente disso. Mesmo assim, viver um dia após o outro não faz mal, e, acima de tudo, me deu uma visão completamente diferente da vida: há altos e baixos, nenhuma situação é permanente (nem o alto e nem o baixo), tudo pode acontecer, e com tudo que acontece, a gente precisa saber lidar da melhor maneira. Saber disso tem me ajudado. O desespero é que nunca ajuda.

E no meio de tudo isso, me diverti tanto... tive tantas provas de amizade. Ri, realizei coisas novas. É isso. Vivi.

Depois desse ano, mesmo não tendo nada concreto no horizonte, eu tenho esperanças. Porque ela continua, independente da minha vontade. Então, vamos ver... eu só quero respirar fundo no fim do dia e ter paz comigo e com Deus.

Listen.


You should think of a lesson
As a weapon of love
And teach your brother
Teach your sister
Think of a lesson as a weapon in love

There's nothing you can do
But let time tick
Stay positive and show stiff lip
Nothing you can do
But let time tick away

Sunday, December 13, 2009

Águas cristalinas

Eram sete da manhã quando ele fez os últimos preparos.

Não havia razão para ficar mais tempo na cama. A noite anterior não tinha sido boa e seus sonhos foram novamente povoados pelos pesadelos que, desde o último mês, ele conhecia bem.

Colocou tudo que tinha em cima da cama. Selecionou algumas roupas, não precisava de todas. Além das roupas, colocou na mochila uma bússola e um binóculos. Todas as lembranças que lhe remetiam a outros tempos, ele deixou no armário. "Era hora de deixar o passado para trás", pensou.

Enquanto caminhava até a enseada, inúmeras dúvidas lhe apareceram. Seria essa uma vigem somente de ida? Ainda precisavem dele por aqui? Ele encontraria o que procurava para além do horizonte?

Ninguém poderia responder aquelas perguntas. O risco era inerente à sua escolha...E foi aí que ele lembrou de suas próprias lágrimas. Lembrou da fonte de seus pesadelos, da tristeza toda. Se ainda precisavam dele ali, que o procurassem então, pois não era o que parecia. E mesmo não encontrando o que ele procurava, a sua busca, por si só, já o preenchia com algum significado.

Quando percebeu que encarar o risco de zarpar sem rumo era ainda melhor que o risco de estar ancorado naquelas águas escuras, ele teve certeza que a viagem seria só de ida.

Chegando na enseada, ele se deu conta que não se despediu de ninguém. Então ele olhou para o céu e pensou: "que eles me perdoem, pois eu não vou voltar".

Finalmente entrou na embarcação. Havia um homem posicionado em frente ao leme que parecia ser o capitão. O homem tinha cabelos brancos e longos, olhos azuis, barba por fazer e usava um enorme cordão com uma cruz dourada pendurada.

Ele saudou o capitão, que retribuiu gesticulando com a cabeça. Perguntou sobre os outros tripulantes e se supreendeu quando o capitão respondeu: "Não há outros. Esse é o seu barco, só vc pode navegar nele". Com estranheza, ele perguntou "mas porque só eu?".

- Você não é o homem dos pesadelos? Você não é aquele que se perdeu nas águas escuras e profundas da solidão? Não é você quem precisa de um recomeço?- Perguntou o capitão.
- Sim, mas...
- Então esse é o seu barco! Vou te levar de volta paras as águas cristalinas...Vou te levar para a verdade novamente. Vou te levar para um lugar onde você possa dormir tranquilo.
- E que lugar é esse?
- Não, essa não é a hora de perguntar isso. O lugar será revelado quando estivermos perto de encontrá-lo.

De fato, não havia um lugar específico para seguir, apenas não havia mais razões para ficar...Se alguém lhe perguntasse para onde queria ir, simplemente não haveria resposta e o capitão, por razões ocultas, já sabia disso. E isso já era o suficiente para zarpar.

Ele se posicionou ao lado do capitão, que lhe perguntou "Podemos ir?". E ele respondeu: "apenas me tire daqui".

O barco partiu.

Sunday, November 22, 2009

Paulocoelhando

Desculpa aí quem gosta, mas Paulo Coelho gera milhões apenas repassando pérolas de sabedoria dantes presentes na obra de Confúcio, na Bíblia, no Corão, you name it... É claro que elas nos tocam porque são verdadeiras, mas, como tudo nada vida, só são absorvidas, aprendidas e vividas naqueles momentos decisivos que acontecem na vida de qualquer um. Não sei se alguém já teve a experiência de mudar de vida completamente porque leu um livro do Paulo Coelho e autoajudas afins. Eu tô aprendendo na marra mesmo. A vida é bem eficiente em nos ensinar, e a gente nem precisa ler em livros coisas como...

1) Nada dura para sempre
Por mais que a gente pense que a situação, boa ou ruim, é permanente, não é. A fase difícil que nunca se resolve, pode ter uma resolução completamente surpreendente, previsível, boa, ruim ou até nem vamos perceber, mas a coisa sempre vai evoluir pra outra. É só parar pra escutar a trajetória de vida de outra pessoa, se é que a nossa própria não seja o suficiente para darmos o devido crédito. Acontecem um milhão de coisas, altos e baixos, reviravoltas... a gente só tem que tocar o barco e esperar, temos que...

2) Dar tempo ao tempo
Ansiedade e nervosismo são tremendos inimigos. Acabam nos sabotando porque a gente quer ver a coisa acontecer, e fazer acontecer. Acontece que é aquilo, nem sempre a gente tem o que quer, muitas vezes nossos desejos dependem de outras circunstâncias - e até de outras pessoas -, e aí a coisa complica. No fim, a gente faz o que pode. Contra a ansiedade e confusão, só nos resta...

3) Respirar
O conselho mais óbvio, porém tão eficiente. Respirar profundamente acalma os pensamentos, tira as nuvens que nos embaçam, colocam o corpo em ordem quando tudo gira. A gente toma cada uma que perde o rumo... não sei dizer com precisão os efeitos físicos de um bom exercício de respiração, só sei que funciona. Nos momentos mais angustiantes, podem salvar aquele fiapinho de sanidade que nos resta e fazer com que a gente...

4) Pare de pensar demais
Pare de pensar que tudo acontece só com você. Pare de pensar que o mundo tá conspirando contra. Pare de pensar que tudo revolve à sua volta e você é o umbigo do universo. Pare de fantasiar, coisas boas e coisas ruins, por que se as boas não acontecerem, só vão gerar frustração. E se as ruins acontecerem ou não, só de pensar nelas já derruba qualquer um. Pensar demais pode paralisar, impedir a ação, prender a pessoa no mundo das fantasias. É quase impossível desligar isso, mas é preciso...

5) Confiar
Life goes on. Keep walking.

Leu? Aprendeu? Claro que não. Como eu, você só vai aprender vivendo, navegando e levando as ondas no casco...

Saturday, November 21, 2009

O dia de amanhã

Finalmente, chegou o dia.

Eram 07:32 quando eu olhei o despertador. Não me levantei de primeira, pois raramente levanto. Fiquei na cama até 07:54.

Me dirigi ao banheiro como é de praxe. Sem olhar no espelho, abri a pia e enchi as mãos de água. Minhas mãos não estavam trêmulas como eu achava que estariam. Joguei a água no rosto e finalmente encarei o espelho.

Apareceu um homem com o rosto coberto de água. As olheiras eram nítidas e desde muito tempo estavam ali. O cabelo era desarrumado como de quem acabou de acordar, mas os olhos...Havia algo de errado com aqueles olhos castanhos. Mas o que era? Estavam mais apagados? Estavam menos corajosos? Bom, estavam menos interessantes agora. Tristes, eu diria.

Abri o box do banheiro. Escolhi água fria. Costumo pensar que tomar banho frio é um tipo de penitência ou castigo. Mas, além disso eu sabia que quando tomo um banho frio não consigo pensar em nada, apenas na dor momentânea da água fria batendo na minha pele quente de quem acabou de acordar. Demorei um pouco mais nesse banho. Ficar sem pensar em nada era melhor embriaguez...

Fechei o botão da calça, coloquei o cinto. Já sentado coloco o sapato do pé direito e depois o do pé esquerdo. Faltava amarrar os cadaços. Eu me demorei um pouco, fiquei pensando para onde eu iria, se o dia no escritório seria bom hoje. Como estaria meu nível de concentração, afinal? Entre pensamentos e lembranças, notei que a partir de hoje o meu caminhar seria solitário.

Lembrei da frase do Alberto Goldim que tinha lido no dia 15 de novembro. Ele falava sobre relacionamento e da importância de alinhar os interesses e não fazer jogos ou coisas do tipo. Até que ele termina a resenha com a seguinte frase:

Quando conseguem se encontrar em paz, ambos ganham um fantástico prêmio: o direito de lutar juntos para combater a solidão universal, habitando um sólido castelo, luxuosamente decorado com seus próprios projetos e ilusões.

Projetos...sonhos...ilusões. Tudo isso eu tinha e nada disso era meu.

Estava na hora de combater a solidão universal novamente. Sozinho dessa vez, não havia dúvida quanto a isso. Era assustador...

Escolhi a camisa branca. Fechava os botões e nada daquilo parecia fazer sentido. Coloquei a gravata cinza, pois era ela que melhor expressava o meu humor ou a ausência dele. Coloquei o paletó preto, por fim. "Deveria ser como uma armadura", pensei.

Peguei o ônibus. Sem ouvir música, dessa vez. Minha intuição dizia que música seria pior...

Desci no ponto, no ponto de sempre. Do outro lado da calçada vislumbrei a construção. Era o prédio do relógio gigante. Não era só um prédio, era um santuário também. O templo do Deus do Tempo, como eu sempre pensei.

Antes de entrar, fiz uma oração ao Deus do Tempo:

Mestre, você sabe quem é o discípulo que vos fala agora. Tu sabes que sempre segui com disciplina e coragem todos os seus ensinamentos. Passei por seus inúmeros desafios, suportei teus anocronismos e passei pelos jejuns que me impuseste com esperança em meu coração. Aprendi a ter paciência contigo e cresci debaixo do teu manto esperando sempre as surpresas que vinham com a tua chegada. Poucas vezes te pedi alguma coisa, mas hoje pedirei com toda humildade.
Me cura, Mestre. Use os poderes do Tempo para curar as feridas desse meu coração. Cuida de mim. Não deixe que as horas, os dias ou os meses me torturem. Faça com que tudo passe, com que meu espírito evolua. Me traz a cura, Mestre. Me exalte e me traga de volta para as batalhas com os poderes do Tempo.
Que assim seja.


Logo em seguida, o sinal de trânstio abriu e eu atravessei a calçada. Entrei no templo com as esperanças de que fui ouvido.

Era mais um dia de trabalho e as coisas ainda não faziam o menor sentido.

Sunday, July 26, 2009

Não alimente os animais

Alguns dias de felicidade não macaqueiam as dúvidas e escolhas a fazer da vida. Talvez só as deixem no canto, barateando por algum momento. Mas ainda estão lá. Algumas são elefantescas demais para serem escondidas debaixo do tapete, algumas têm importância leonina, assustam-nos com seus rugidos, urgem uma posição. A vida cisma em ser camaleônica, as certezas de um dia não são mais certas no outro. Enquanto não tenho a sabedoria de uma coruja, ainda deixo a dúvida invadir minha casa, sorrateira como uma cobra. Quando abro os olhos, está lá, essa presença silenciosa e incômoda. Cedo ou tarde, ela poderá dar o seu bote.

Essas pequenas e determinadas formiguinhas invadem meu cérebro, atrás de alguma guloseima para roer. Displicente com a ideia de estar formando uma colônia cada vez mais profunda, acho-me a alimentar os bichinhos. Logo o meio ambiente adequado atrairá outros. Está aí um ecossistema favorável para o crescimento e desenvolvimento de qualquer caraminhola! Virão, dos vegetarianos aos carnívoros, a pedir meu sustento, enquanto desenho os pastos intermináveis e tento manter o equilibrio, enquanto os predadores atacam suas presas seguindo o ronco interior.

Agora isso cansa, não deveria ter começado... eles estão mal acostumados. Não posso mais ficar como um bicho-preguiça: as onças estão à solta. Devo mandar a seca, deixá-los morrer, migrar... sou quem preciso sobreviver.

Para ouvir: Talking Bird - Death Cab For Cutie
"The longer you think, the less you know what to do..."

Saturday, July 11, 2009

Liberdade de expressão para os bons

Liberdade de expressão, essa coisa esquisita... enfim, escuta-se muita sandice nesse mundo. Besteira é o que o povo adora falar, difícil é quando a pessoa fala besteira acreditando que não é. Aí é duro.

Eu não costumo falar muito em público. Eu prefiro ouvir, por medo de falar uma besteira muito grande. Isso me atrapalha um pouco, quando eu perco oportunidades de dar algum exemplo ou fazer uma pergunta. Eu prefiro pensar um pouco mais e perguntar pra outra pessoa depois, se for algo que eu realmente não consegui descobrir sozinha. Depende do momento também, às vezes cismo em fazer alguma piada, mas só quando eu tenho certeza que todos vão rir.

Não falar muito também me atrapalha quando eu acabo não defendendo minhas ideias em público. Eta pós-moderninade que me faz relativizar. Mas depois de ver tanta gente defendendo tanta sandice, acho que eu relativizo demais. Oras, se tanta gente pode dizer sandice, por que eu não posso dizer sandice também? Por que vai que não é sandice?
Deveria ser um fato comprovado pela ciência que a maioria das pessoas não submetem suas palavras ao cérebro antes de dizê-las. É triste constatar que há muita, mas muita gente sem-noção nesse mundo.
Formadores de opinião? O que é isso hoje em dia? Representantes da boas e velhas instituições, como Igreja e Estado. Fora o exemplo do pastor já citado, o que dizer das frases do nosso presidente Lula? E tem o maior nível de popularidade do pais, vai saber. Então, fora isso? Quem tem o microfone pra uma mega audiência todo domingo? Quem está entrando nos lares de segunda a sábado nos lares brasileiros no horário nobre (você conhece algum indiano morando no Rio? É, nem eu.)? Qual é o escritor brasileiro com maior reconhecimento nacional e internacional, vende milhões de livros em que copia os mesmos ensinamentos mais clichês de Confúcio como se fossem deles? Qual ex-BBB está todo dia no maior portal da internet?
Por que o microfone tem que cair na mão deles? Por que ganham tanto espaço? Por que tanta gente diz "amém"? Mistério...
Todo mundo fala muita coisa. Todo mundo se vê no direito de dar uma opinião. Todo mundo acha que tem alguma coisa a dizer. É muita informação. Qual foi a última que você realmente guardou por que achou que valia a pena?

A moral da história, amizade, é essa: "O que mais preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons." Martin Luther King, que era pastor...

p.s.: se é pra ficar encucado com alguma coisa, fique encucado com o fato de muitos pastores falarem sandice nos cultos, mas os milagres continuarem acontecendo. Por que sim, acontecem. Já aprendi que se é parte da promessa de Deus que haja cura ou libertação, vai acontecer, independente se o pastor for ladrão, burro e falar errado. Por que não é ele que realmente faz os milagres, é? Só que aí esses pastores ganham seguidores. Por que um pastor tem que ter seguidores? Ok, voltando à analogia primária, as ovelhas sim, seguem o pastor. Mas o pastor também é responsável por elas, por guiá-las por pastos bons e águas limpas, por tratar-lhes as feridas, para protegê-las dos lobos... Enfim, pastores são humanos e passíveis de erros como suas ovelhas. O que nós precisamos ter é discernimento pra submetê-los e a nós mesmos aos ensinamentos do Chefe. É isso que falta...

Friday, July 10, 2009

Quanta ignorância

Costumo ligar a TV toda vez que acordo para ouvir as últimas notícias e saber como está o trânsito (nos dias de semana) ou para assistir qualquer coisa (nos fins de semana). Em um sábado qualquer, acordei e liguei minha TV como de costume. Estava passando um dos milhares de programas evangélicos da BAND e um pastor, cujo nome não me recordo (não era figurinha repetida como o Malafaia e o R.R. Soares), pregava fervorosamente (pra variar).

Ainda estava em estado de semiconsciência quando ele me despertou totalmente ao dizer (aos berros) a seguinte frase: "porque quem vai contra o seu patrão, vai contra Deus. Você sabe que o Direito do Trabalho é paternalista e pró-trabalhador e mesmo assim você se volta contra o seu patrão!"

Depois de o pastor dizer essas palavras no mais alto tom, ouviu-se um coro: "Amém!". Eram os ouvintes (os fiéis).

Fiquei muito triste com o que ouvi, pensei nisso por umas duas semanas. Se eu fosse jovem, ficaria revoltado, mas agora eu fico triste ao ver uma ignorância dessas sendo confirmada pelas pessoas...O pastor foi irresponsável por dizer uma idiotice sem tamanho e os fiéis ratificaram tranquilamente. A ignorância deve ser mesmo uma benção, pois é libertadora. Te permite afrontar qualquer coisa, mas principalmente o bom senso.

Você vai me dizer que essas pessoas (com exclusão do pastor), em sua maioria, não tiveram boa base de estudos e muitas são de origem humilde. Além de concordar com você, eu vou complementar o raciocínio dizendo que, por não terem estudo e cultura geral, essas pessoas são mais sucetíveis a um formador de opinião (no caso, o pastor). Como alguém disse uma vez, "o encosto só se apodera das pessoas pobres. No dia que exorcizarem o Eike Batista lá no meio do palco, com ele de joelhos e falando grosso, os olhos revirados, eu passo a acreditar em tudo".

Superando isso (que não é o assunto principal), sinto necessidade de dizer que o tal pastor estava totalmente equivocado e criou um sofisma ao dizer que quem se revolta contra o seu patrão, se revolta contra Deus...De fato, o Direito do Trabalho adota a posição "pró-trabalhador" e, para alguns, pode ser entendido como paternalista (apenas no sentido de que busca tutelar com a maior eficiência possível os interesses do trabalhador). Mas isso não colabora em absolutamente nada para o falso silogismo elaborado pelo pastor.

Basta fazermos a seguinte pergunta: Por que o Direito do Trabalho seria pró-trabalhador?

Já experimentou duelar numa lide contra uma grande empresa? Você e seu defensor público contra uma multinacional e a melhor banca de advocacia do Brasil. Nesse caso quem é o hipossuficente? Quem tem mais condições técnicas e econômicas de produzir provas? Será que que a verdadeira igualdade não significa tratar desigualmente os desiguais? Penso que sim.

A história do Direito do Trabalho, querido pastor, acompanha a evolução da sociedade que caminhou da servidão ao trabalho assalariado. Mas uma coisa eu garanto: demorou muito para chegarmos à tutela especial da Justiça do Trabalho e antes disso muito sange rolou. Imagine quantos trabalhadores foram mutilados nas novíssimas máquinas da na Revolução Industrial e não tiveram ressarcimento de nada. Quantos foram os abusos com jornadas de trabalho que ultrapassavam o limite do humanamente possível? Quanta gente morreu de tanto trabalhar? Quantos tiveram que ouvir que não seriam ressarcidos do acidente sofrido porque a "empresa não teve culpa" (antes da idéia do risco do empreendimento e a responsabilidade objetiva)?

Os casos são incontáveis. O advogado Fábio Ferraz ilustra bem a situação do trabalhador no Estado Liberal ao dizer:
"O individualismo levava a uma exploração do mais fraco pelo mais forte. O capitalista livremente podia impor, sem interferência do Estado, as suas condições ao trabalhador. Havia mera igualdade jurídica. Em curto tempo, estavam os mais ricos cada vez mais ricos e os mais pobres cada vez mais pobres. O mais forte subjuga o mais fraco." (link)

O hipossuficiente precisa ser tratado com cautela, precisa ser melhor protegido, sim. E por isso o Direito do Trabalho adota o in dubio pro misero, ou seja, na dúvida (em caso de lacuna probatória, por exemplo) se decide a favor do trabalhador. É uma questão de necessidade e não capricho. Duvido muito que Deus "figure no pólo passivo" do processo movido entre o trabalhador e o empregador. Também não acredito que Deus se volte contra o trabalhador por ele perseguir um direito seu!!!

Mas ainda se pode argumentar que tudo isso é uma interpretação errada que eu fiz da frase. Você pode querer me convencer que o que o pastor quis dizer é que o trabalhador não deve mover ação contra seu patrão sabendo que não tem direito algum, apenas na tentativa de conseguir alguma vantagem...

Isso não muda abolutamente nada o que foi dito acima!!!! O direito de ação é garantia constitucional (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal de 1988). Se o trabalhador promove uma ação contra seu empregador sem ter direito (o que é bem mais raro pela bagunça que é o Brasil) ele ganhará uma sentença de improcedência e acabou. O direito de ação ele vai ter sempre. O fato de o Direito do Trabalho ser "pró-trabalhador", não é sinônimo de vitória automática, nem de vitória a qualquer custo.

Prefiro acreditar, depois de tudo isso, que o pastor se equivocou pela sua ignorância com relação ao tema e que não estava falando como um "homem de negócios".

Enfim, fica o manifesto. Um formador de opinião deve ter um mínimo de cuidado com as afirmações que lança para o seu público, sob pena de cometer aberrações como essa.

Wednesday, May 20, 2009

Inside someone's mind

- Ele ri com vontade, e pareceu-me que todos que o cercavam estavam cada vez mais perto. No centro da roda, ele levanta o copo de cerveja, como quem fosse fazer um brinde, mas continua a conversa, dessa vez falando ainda mais alto. Ele já bebeu um pouco além da conta, e eu não estou feliz com isso. Por mais que eu tente me enturmar, no final, eu sempre fico meio de longe, calada, segurando o mesmo copo há 1 hora. Eu vejo sua personalidade mudar, e vejo sua felicidade (genuína, apesar de etilicamente exacerbada) de estar ali, naquele local, cercado daquelas pessoas. Parece ser coisa que mais lhe é rara. Liberdade. Liberdade? Não dá pra não ser um pouco imatura e pensar, "e eu?". É nessas horas em que eu me vejo forçada a pensar por que afinal estou com ele.

- Me disseram que eu deveria estar feliz, mas acho que tem alguma coisa errada. Mais uma vez estamos no mesmo lugar, e eu, sentada em uma mesa atrás dele, fiquei esperando que ele virasse e me olhasse. Ele se levantou por algum motivo qualquer, e então desejei que ele chegasse mais perto de mim. Ele poderia me beijar. Bom, talvez fosse demais, com aquelas pessoas ao nosso redor... ele poderia me abraçar ou... me tocar de alguma maneira, acariciar meus cabelos por algum segundo. Ou poderia só me olhar, pra eu ter certeza de que ele está ali como eu estou ali, um pro outro. Ele se virou e sentou novamente, de costas para mim. É nessas horas em que eu me vejo forçada a pensar por que afinal estou com ele.

- É estranho ver o que nela há de mim. Eu que sempre acreditei que as pessoas saem de uma relação com algo de alguém, e esse alguém, com algo meu (hopefully!). Sempre acreditei cada pessoa é única e exerce unicamente seu papel na vida. Não dá pra substituir ninguém, como quem apaga da mamória, sem que não sobre nenhum resquício ou marca. Há uma troca. Ela me disse que pensava assim também, mas daí a acreditar... Hoje é estranho vê-la passar. Trazendo no corpo aquela coisa minha. É estranho perceber. Envolve seu quadril, abraça suas coxas, desce aos seus pés. Centenas de pequenos quadrados, cada um deles sou eu. É nessas horas em que eu me vejo forçada a pensar por que afinal não estou mais com ela.
- Depois de algum tempo, passou a ser mais aceitável a possibilidade de uma vez quem sabe vir a esbarrar com ela na rua, por aí. Antes eu ficava assombrado, e somente pensar nisso me dava uma certa taquicardia. Foi tão difícil tomar a decisão, executar e continuar a vida, sabendo que no mundo havia mais dois corações feridos e incompletos, dependentes da ação do tempo e da vida pra serem curados. Mas fui me convencendo que era o certo a se fazer. A sensação de insegurança era demais pra mim, eu precisava de uma certa coisa que... não chegava. Um suporte emocional maior, uma resposta mais adequada às minhas ansiedades. O problema podia ser meu, mas eu sou eu e então era preciso encaixar em algum lugar. Tomei meu rumo de pronto, e o tempo foi passando. Mas um dia seria inevitável. Nunca imaginei que numa situação dessas... numa festa de alguém que eu nem imaginava que ela conhecia. Acho que ela foi parar lá por causa de uma amiga de um amigo... no meio de um monte de gente, lá estava. Acompanhada, mas independente, linda, linda... No centro da roda, ela levanta o copo de cerveja, como quem fosse fazer um brinde, mas continua a conversa, dessa vez falando ainda mais alto. Ela já bebeu um pouco além da conta, e sorri fácil. E eu sinto... saudade? Desejo? Culpa? É nessas horas em que eu me vejo forçada a pensar por que afinal não estou mais com ela.

Sunday, May 17, 2009

The shape of things to come*

Ando preocupado ultimamente. Algumas de minhas convicções (não dá pra dizer que são todas) tornaram-se dúvidas. E o ser humano, eu sei, não lida muito bem com dúvidas.

As dúvidas paracem perseguir com obsessão o esclarecimento. E quando o esclarecimento não vem só resta o nervosismo e a gastrite...Te juro que se eu fosse fumante estaria tragando o décimo cigarro...Se eu fosse alcoólatra estaria transpirando wisky...Mas, por não ser nenhuma dessas coisas, resolvi escrever sabendo que "words are, of course, the most powerful drug used by mankind" (Kipling).

Quero ir direto ao assunto, sem muitas alegorias, mas não posso fazer disso um diário ou um confessionário. Isso seria absolutamente errado levando em consideração as intenções iniciais desse blog. Por essas razões, me parece prudente (prudente é ótimo) escrever a minha prosa pouco elucidativa de sempre.

Eu sou o tipo de pessoa que não acredita que o destino está todo escrito de forma que nada que façamos poderia mudá-lo, ou ainda, que todas as atitudes humanas já foram previamente estabelecidas uma vez que o destino não muda. Quando ainda era bem jovem, no início da adolescência eu pensei que "se o meu destino está selado não há qualquer razão para me levantar da cama todos os dias e encarar meus professores, me esforçar em aprender coisas inúteis como física e handball, e etc. Se tudo foi estabelecido, não faz diferença".

Eu me revoltei com esse pensamento e amadureci a idéia. Mesmo por que a minha vida não foi das mais fáceis e eu sempre lutei para que ela fosse diferente (como está sendo) e nunca acreditei em pré-destinação. A partir de certo momento (ainda bem jovem), eu passei a acreditar que meu destino estava nas minhas mãos e que a vida me dava todas as escolhas possíveis. A cada escolha feita há uma consequência e assim é que se constrói o destino, fazendo escolhas e analisando as variáveis. Apesar de acreditar firmemente no karma, eu tenho certeza absoluta que de que ele traz livre arbítrio. Ainda que o karma me traga provações ao longo da vida, em cada provação estará uma oportunidade de evolução espiritual. Dependendo das minhas escolhas, da minha vontade livre, poderei evoluir ou não.

Enfim, isso tudo foi para explicar que eu acredito nas variáveis, acredito que não existe uma eterna constante que te guia e te leva para as situações que o destino escreveu antes mesmo do seu nascimento. E é justamente por pensar assim que eu faço questão de ter minha vida nas minhas mãos: eu sou o arquiteto.

Mas como fazer um obra conjunta com alguém que se deixa levar pelo destino? Enquanto um compra material, contrata mão de obra e começa a emplilhar os primeiros tijolos o outro pensa "se esse prédio tiver que esxistir, ele vai se edificar de forma autônoma. Para que esse prédio surja não preciso mover um tijolo, pois o único operário necessário é o Destino. E depois que o Destino terminar de construir esse prédio, basta entrarmos nele e vivermos felizes, se assim quiser o Destino."

Deu para entender? Enquanto um dos persongens arruma tempo para buscar maneiras próprias de tirar esse prédio, esse sonho, de sua planta, de sua imaginação o outro espera sentado que dê tudo certo. Enquanto um pensa em quanto dinheiro precisa levantar para mobiliar a moradia o outro se pergunta em que restaurante vai almoçar hoje.

Eu tenho dúvidas sobre como resolver essa situação. Quer dizer, se tudo depende do Destino, posso afirmar que para alguns ele é um tremendo puxa-saco babaquinha e dá tudo de mãos beijadas, mas para outros, meu amigo, ele é uma puta insensível e sádica, que além de te fazer pagar para receber chicotadas na bunda, ainda ri da sua cara no final.

Eu não gosto de depender do destino. E tenho um prédio na planta para construir. Eu tenho um sonho bonito pra caramba que merece a chance de acontecer. Merece muito. E, até pouco tempo, parecia que eu sabia todo o passo-a-passo. Mas agora, eu não sei nem onde encontrar meu primeiro tijolo. Contruir em conjunto é bem mais difícil do que eu pensava...

* O Rubem Fonseca disse que o inglês é o novo latim (in Bufo & Spallanzani).


Monday, May 4, 2009

Um despretensioso conto colaborativo - TERCEIRA PARTE

No exato momento em que senti meu ossos se chocando contra o chão duro e frio, eu finalmente admiti que tínhamos ido longe demais. E quando a dor na queda não doía mais, quando a dor dos disparos não doíam mais... bom, a dor no peito agora parecia causada pelas emoções do que tiros... engraçado como a gente consegue mentir tão bem para si mesmo, ao ponto de virar uma verdade em que cremos veementemente. Incrível...

Fomos longe demais em pequenos passos, pequenos o suficiente pra gente se acostumar e curtir a paisagem. E quanto mais motivos aparecem para condenar o que fizemos, mais motivos criamos pra justificar nossa própria vontade. E aí... "não é assim tão errado", "fomos levados a isso pelas circunstâncias", "precisamos disso pra mantermos a sanidade", ou "é só uma coisa boba". Mas, quando pensamos em sair... "é tarde demais, estamos envolvidos demais".

Lembrei, ali mesmo, enquanto minha garganta fechava e algumas lágrimas escorregavam pelos meus olhos, que quando me apaixonei pela primeira vez, ainda nova, eu soube que não conseguiria viver sem alguém que cuidasse de mim. Eu posava de muito livre e independente, e a cara fim de namoro eu jurava que não queria mais ninguém, e em 10 dias, já estar em outro relacionamento. Eu não buscava, eu juro! Ou achava que não... Mas nunca estava solteira. Engraçado... Mas olha, eu não ficava trocando de namorado toda hora. Eram relacionamentos longos, raramente traía, um ou outro, bem na adolescência... bobagens. Ainda nova, já formada, com um bom emprego, eu tinha acabado de me separar de um cara com quem eu morei uns 3 anos. Ele queria casar no papel, filhos, uma vida chata de margarina e eu percebi que era nova demais pra me prender. Inconscientemente eu já devia saber que não ia ficar sozinha por muito tempo. Ele saiu, eu fiquei no apartamento onde tudo era meu mesmo. E como sempre, em poucos dias eu já estava sentada num restaurante da Zona Sul com esse cara interessantíssimo, charmoso... duas taças de vinho e eu já me joguei, como sempre fazia. Se iria dar certo ou não, sei lá.

Deu certo. Dante era um homem fascinante, e não me pareceu estranho me casar com ele. Ele lidava comigo de um jeito completamente diferente dos outros. Os meus antigos parceiros pareciam ter medo de me perder a qualquer momento. Eu era mais segura. Dante passava segurança, como se tivesse certeza de que eu precisava dele. Então, eu passei a precisar mesmo.
Bateu o medo de ele me achar carente. Eu passei a fingir que era segura também. Os primeiros anos foram difíceis, mas depois essa transformou-se em mais uma mentira que eu quis acreditar. A empresa dele foi crescendo assustadoramente, o dinheiro entrava aos montes e o nosso padrão de vida deu um salto. Casa nova, reformas, nosso filho... tinha coisa demais pra administrar, eu precisava ficar em casa agora. Que bela ironia, eu abraçava o tédio. Ficava arrumando coisas novas pra fazer. Cerâmica, decoração, tai-chi... Dante estava na ponte aérea, nosso filho crescia tão rápido. Um dia ele disse "tchau" e foi estudar na Inglaterra. Dante não me dava "tchau" quando saía... Mas era um equilíbrio constante que eu não queria quebrar.

Até... bom, até arrumar um amante. Ok, não vamos dissimular porque eu tô achando que vou morrer. Até minhas amigas falavam, cheias de segundas intenções, que eu precisava de algo excitante em minha vida. Ajudar a manter minha auto-estima, me deixar satisfeita. Ele era um chef em ascenção, o que quer dizer que tinha tempo livre pela manhã... Apesar de sua dedicação na cozinha, fora dela ele não tinha muito cuidado com suas palavras e atos, era insensível, bruto, desajeitado. Outro belo paradoxo. Era inseguro fora do espaço em que dominava. Então era eu que tinha essa função. E adorava.

Só que, em casa, as coisas não melhoraram. Pelo contrário. Recuperada minha confiança, eu e Dante brigávamos cada vez mais, a intensidade aumentava devagar, a cada embate. Eu me descobri ácida como nunca havia sido. E atacava tudo que me desagradava com fúria. E quão furiosa eu não fiquei quando encontrei uma mensagem estranhíssima no celular dele. Não, eu não queria espionar, mas quando ele insistia em tocar de madrugada, num dia em que Dante tinha acabado de sair para o escritório, eu perdi as estribeiras. Minha primeira opção foi jogá-lo pela janela, mas o treco vibrou em minha mão. A pessoa desistira de ligar e mandara uma mensagem de texto. Não consigo explicar, eu simplesmente apertei o botão. Segundos depois, Dante entrou correndo no quarto. Ele tinha se dado conta que o aparelho não estava com ele. Tarde demais...

Saturday, April 4, 2009

Um despretensioso conto colaborativo

Tá na moda, né? Com a internet, tudo agora tem apelo participativo... Tive essa idéia (ggrrr, agora é sem acento) por que meu partner poderia trazer muito de sua área pro negócio.

Por isso, ele tem a liberdade para modificar, cortar, aumentar, criticar, dizer que tá ruim e apagar o post! :-P

Bom, aí vai, a coisa começou assim:

Na minha mente há um tribunal em que eu sou sua advogada. Enquanto os outros te consideram réu, eu estou disposta a fazer tudo para provar sua inocência. Acredito no seu depoimento. Em frente a um juri ignorante, eles apresentam provas da sua culpa, as quais julgam irrefutáveis. Eu protesto! Não há testemunhas. Acima de tudo há o benefício da dúvida.
Meu cliente não precisa fazer muito. Eu uso de toda a minha elouquência (até praticamente enlouquecer...). Cito as leis, seus parégrafos e interpretações. Recrio o cenário do crime mais uma vez, e outra, e outra.
A acusação grita: "Como você não vê?"
A justiça é cega.
O juiz nunca bate o martelo. E marca outra audiência, para outro dia.
O juri sabe cada vez menos.
Promotoria e acusação ganham mais tempo.
Você sai algemado.
Eu também, aos processos que levo para casa. Pastas, incontáveis folhas de papel, sobre as quais acado dormindo, ao raiar do dia, após revisá-las pela centésima vez, tentando achar um desfecho favorável. Livrar sua cara e provar que nunca estive errada.

Segunda parte

Depois de ter passado mais de quatro horas tentando convencer um júri que se preocupa mais em tentar não cair no sono do que valorar as provas produzidas no processo, resolvi que precisava de uma cerveja.
Combinei com os colegas de profissão no bar de sempre, próximo ao Edifício Garagem Menezes Cortes. Resolvi me adiantar e cheguei com meia hora de antecedência para pensar um pouco sobre tudo o que aconteceu...
Pedi um choppe bem gelado e puxei um banquinho no bar. Bebi o primeiro copo sem degustar, a sede era maior que tudo e o gosto eu já sabia, afinal.
Antes de começar a entornar o segundo copo, comecei a me lembrar do meu início no Direito Civil...Nossa, como foi que eu vim parar no Direito Penal? Eu que sempre entendi que essas áreas não se misturavam, que o Civil era mais seguro... O que me fez mesmo mudar?
Ah sim, o dinheiro! Eu precisava da grana e a grana é alta quando se tem como cliente um homem rico com o Dante, meu atual cliente...
Um homem rico acusado de ter matado a esposa...Não precisava do dinheiro do seguro...jura de pés juntos que se davam bem...Prova do crime? Nenhuma. Tudo o que se sabe é que ele chegou em casa e achou a mulher sem vida no chão usando um vestido branco encharcado de sangue. Dois tiros no peito...casa revirada...objetos de valor roubados...Mas ninguém viu o meliante sair da casa...Crime estranho, mas possível...
A polícia convencionou que o principal supeito era o meu cliente. Não havia pólvora na mão dele, não foi encontrada a arma do crime. No entanto, todos os vizinhos sabiam da briga feia que eles tiveram na noite anterior...Fofoca...foda!
Eles se desentenderam e o Dante saiu de casa com as roupas e tudo mais...Acontece, porra! Não é?
Desce mais um garçom...
Enquanto espero meu copo e me perco nos detalhes que antecederam o crime vejo um casal na minha frente. A mulher é jovem, o homem nem tanto. Ele roça a barba no pescoço dela e ela parece gostar, pois ri enclinando a cabeça para trás. Era uma cena normal até que reparei que ele usava um grossa aliança dourada e ela não...Amantes...a coisa fica mais quente sem as responsabilidade e neoroses de cada dia...
Amante...eu não pensei nisso! Será que ele tinha uma amante?!
Antes que eu pudesse pensar meus amigos chegaram e estávam acenando pra mim na mesa 12.

Sunday, March 29, 2009

Cidade contraditória


“Toda história tem três lados: o meu, o seu e a verdade. 
E ninguém está errado!”
Robert Evans

Teste básico para saber se você é um otimista ou um pessimista: olhe para um copo com água até a metade. Você diria que ele está “meio cheio” ou “meio vazio”?
O Rio de Janeiro é um grande copo com água até a metade. E depende de cada um vê-lo como maravilhoso ou asqueroso. Creio que seja uma questão otimismo, além dos demais graus que essa qualidade pode atingir. 
Dicionário Michaelis: o.ti.mis.mo
s. m. 1. Disposição, natural ou adquirida, para julgar tudo o melhor possível. 2. Filos. Sistema dos que consideram este mundo o melhor dos mundos possíveis.
Tem-se no imaginário popular que o carioca é um ser sempre alegre, feliz; mesmo com todas as adversidades da vida, ele procura sempre dar um “jeitinho”. Um ser despreocupado e mais tranqüilo. Um ser que bate palmas para o lindo pôr-do-sol na praia, que sai do trabalho a tempo de dar uma “esticadinha” até o mar. Que samba o dia inteiro como se tivesse um tamborim ao invés de coração batendo no peito. Inacreditavelmente, as praias estão sempre cheias todos os dias e todos os habitantes da cidade do Rio de Janeiro são incrivelmente bronzeados e naturalmente da cor morena que seduz tanto os “branquelos” estrangeiros que por aqui aportam. Aliás, para eles, a cidade é um paraíso de prazer sexual, onde se rendem às mulatas que os levarão à loucura. Portanto, o Rio de Janeiro pode se resumir a um lugar onde sempre se busca o prazer de viver. 
Naturalmente, isso não deveria ser difícil, com essa abundância de belezas naturais, praias, montanhas, monumentos, cena musical fértil, povo alegre, bem-humorado e bonito. O Rio de Janeiro é muito lindo. E, naturalmente, otimista.
Ser otimista não é ser alienado.
Como consta no dicionário, o otimismo também pode ser adquirido. Algo me leva a crer que é bem mais difícil ser otimista sem poder olhar para o Pão de Açúcar todos os dias pela janela do quarto, ao acordar.
O Rio de Janeiro é muito mais que praia, monumentos, beleza natural e etc. Há um Rio de Janeiro com valão, esgoto a céu aberto, mendigos e crianças de rua. Com casas de palafita e gente vivendo abaixo do nível da pobreza. Com toque de recolher de traficantes e intermináveis trocas de tiros diárias durante a madrugada. Em pleno maravilhoso Rio de Janeiro. 
Uma amiga saiu do interior do país e instalou-se no Rio de Janeiro: “Aqui é cidade grande, onde tudo acontece. Aqui têm muito mais oportunidades para ver meus sonhos realizados. Aqui se vive”.
Meu pai sonha em mudar-se para o interior do país, ele simplesmente cansou-se do Rio de Janeiro: “Não se pode sair para lugar nenhum, estamos presos em casa enquanto os bandidos estão soltos. Não posso passear tranqüilo com a minha família, há noites em que não durmo com o som dos tiros.”
O Rio é cidade grande que cresceu e transbordou pelas margens. Uma série de governos desastrados e populistas, apenas preocupados em fazer paliativos e vender tudo por 1 real, acabou por agravar as condições sociais. Parece que nossa educação e segurança também valem 1 real. Agora, os que caíram fora da “margem” voltam-se contra nós e às vezes parece que se trata de um problema sem solução. 
A pobreza também aliena. Ou melhor, te joga em uma rotina de desgraça por todo lado, parece que só existe isso: desgraça, tragédia, morte. Existem pessoas que não sabem o que é vestibular, que pensam que vida boa só existe na novela das 8 e que na “primeira vez” não se engravida.
Sou suburbana e não tenho vergonha disso. Sou daquelas que acreditam que “é de baixo que se avalia melhor as coisas”. Já fui a eventos de alta sociedade fiquei abismada com o número de gente rica que existe nessa cidade. Mais que automaticamente me veio o seguinte pensamento: “Se existe tanta gente rica, imaginem o número de gente pobre!”
O engraçado de tudo é que a massa desfavorecida invade cada vez mais as zonas nobres. Ironicamente, os lugares onde se vê mais mendigos e trombadinhas são no centro da cidade e na Zona Sul. Penso que eles estão ali com o objetivo de lembrar-nos que eles existem, cutucando essa ferida que não tem previsão de fechar. Mostrar aos turistas que eles não estão no paraíso. Mostrar a nós mesmos que não estamos no paraíso. E muita gente ainda não se dá conta disso!
Há casos de certo otimismo na pobreza. Uma das maiores favelas do mundo fica em Copacabana e virou ponto turístico, com passeios organizados cheios de turistas querendo subir o morro e apreciar a linda vista do Rio de Janeiro, além de conhecer um pouco do modo de vida desse praticamente “bairro”, tudo muito bonito, quase folclórico. Uma favela “fashion”. Também algo me leva a crer que ela não teria tanto sucesso se estivesse em outra zona. É engraçado ouvir alguém dizer “eu sei o que é pobreza, eu já fui na Rocinha” ou “eu vi ‘Cidade de Deus’”. 
Ser otimista também não é pensar que só dar uma esmola, participar de uma caminhada beneficente pela orla ou “abraçar” a Lagoa vai mudar tudo.
Pessimista, eu? Confesso que não sou otimista, sou realista.
Quero ver morar em uma casa onde não se pode acender as luzes depois das 22 horas.
Quero ver abraçar um delinqüente juvenil.
E ainda sim amar o Rio de Janeiro. Então essa cidade será a estes olhos sempre maravilhosa, e estes olhos genuinamente e perfeitamente otimistas.

Wednesday, March 18, 2009

O Centro - parte I: não há santos lá

No meu entendimento, o centro da cidade é um lugar diferenciado.

Lá, pessoas fazem dinheiro, pedem dinheiro e roubam dinheiro. Todo tipo de homem você encontra lá: juiz, advogado, funcionário público, garçom, diretor da empresa, jornalista, policial, engraxate, charlatão, ladrão... O improvável encontro desses homens se dá no centro da cidade.

Lá existe uma bagunça organizada. Em todas as calçadas tem um camelô. Tudo você encontra, seja lá o que for. Uma pilha, uma puta, um jornal...”na minha mão é só um real”, eles dizem.

O lícito e o ilícito convivem tão juntos que já não se vê mais a linha divisória. Ela está gasta, apagada pela ação do tempo... E o mesmo serve para as pessoas: não há santos no centro da cidade. E isso, meus amigos, é questão de sobrevivência.

Saber por onde andar, com quem falar. Saber até onde ir e a profundidade que se pode chegar...Tudo isso se aprende com o tempo, é o normal. Mas se alguém perde essa imprescindível lição, a lei da selva se faz presente e o mais fraco é engolido pelos mais fortes. Sem pena, piedade ou cartão postal.

Também já não se vê linha divisória entre o certo e o errado nas pessoas que lá trabalham. Cada um faz o que tem que fazer. Trabalhar no centro é saber ser ambíguo, não se pode dar mole. Pois em cada esquina te espera uma armadilha, uma ilusão.

Mas o que eu realmente quero dizer aqui é que já não se sabe mais o que é real e o que é falsidade.

Alguém certamente vai lhe pedir dinheiro no centro. No meu caso, isso acontece todo santo dia. Talvez essa pessoa diga que mora fora do Rio de Janeiro e que precisa de dinheiro para a passagem de volta ou talvez ela diga que o dinheiro é para comida e esteja com um bebê no colo. As histórias são várias, mas não são infinitas e isso faz com que cada pessoa já tenha ouvida uma delas.

Minhas dúvidas aparecem quando penso que não tenho como saber se aquela pessoa realmente não vive no Rio de Janeiro e também não sei se o bebê da outra mulher é mesmo filho dela. Ora, é só andar no centro para ouvir o conto do vigário TODOS OS DIAS. Dia desses eu vi na TV que uma mulher usava o filho de outra para pedir dinheiro, pois essa era uma maneira de sensibilizar as pessoas....

Em quem confiar? Para se estabelecer uma relação de confiança com alguém levam-se anos e ali, naquele momento, essa pessoa quer que você acredite nela, que você sinta pena dela, que você seja generoso, altruísta e muitas vezes...cego.

Confesso que já não consigo mais ser cego no centro da cidade. Eu olhei nos olhos do mundo e não gostei do que vi. E essa visão fez de mim uma pessoa diferente e fez com que os meus olhos não fechassem mais. Ajudo quem eu conheço, certamente. Mas quando não reconheço a verdade crua, nua e brutal nos olhos de quem vem me pedir dinheiro, prefiro hesitar É como eu disse antes: não há santos no centro da cidade.

Saturday, February 28, 2009

Nunca escrevi sobre você

Depois de certo tempo eu admito que parei de escrever sobre minha intimidade. Não houve qualquer questionamento prévio da minha parte, eu apenas convencionei comigo mesmo que a melhor forma de preservar certas coisas das maldades mundanas era a ocultação.

A razão de eu nunca ter escrito a seu respeito começa nesse ponto: eu quis te preservar do mundo. Quis guardar a imagem que tenho de você só pra mim. Não era uma questão de egoísmo, mas sim uma questão de tutelar aquilo que há de bom na minha vida.

Mas outros motivos me levaram a não escrever sobre você. Eu nunca senti a necessidade de colocar no papel (ou em um blog) as palavras ou os sentimentos que eu tenho por você. A nossa estória eu escrevo no nosso cotidiano. Pois quando a noite cai e o cansaço não estanca, é no teu colo que eu descanso. Quando a vida desanda ou o peso é maior do que se pode suportar, tua palavra me levanta.

Tudo que tenho para lhe dizer eu declaro para os teus olhos. Eu viajo em teus beijos e teu corpo me faz casa. Tudo em mim sinaliza pra você quando não me restam mais palavras.

Não havia, e ainda não há, necessidade de te escrever muitas palavras. Não haveria como descrever nossa parceria, nossa vida corrida, nossa desordem arrumada. Não haveria como descrever minha musa, minha mulher, minha namorada. Não existe esse conceito. Só existe o clichê e a coisa abstrata.

Não quero compartilhar com o mundo todas as emoções que tenho com você. Não quero que eles saibam o quanto você é pequenina em meus braços ou que eles vejam o quanto eu sou gigante nos teus sonhos. Eles não merecem nada disso: nem saber, nem sentir.

Nossa vida é a batalha que enfrentamos juntos a custa de muito suor, amor e lágrimas. Cada passo, cada vitória, tudo isso é nosso. E ainda que a maré das circunstâncias me largue só em um oceano de dúvidas, É VOCÊ MEU PORTO SEGURO. É na tua luz que eu me guio, no teu cabelo que eu me enxugo e é teu corpo que me tira o frio.

Não é necessário escrever essa prosa, mas apenas vivê-la. Não perca tempo em lê-la, mas passe seu tempo do meu lado.

PS: Amo você.

Friday, February 27, 2009

Mais dois palhaços no salão

Quero que você se divirta hoje
Quero me divertir também
Esquece, essa noite
Esquece o papo, vem dançar

Esquece o que te atrai
Esquece o desejo
Esquece o coração
Esquece o toque
Esquece o beijo
Essa noite, enquanto a gente ganha o ar

Esquece a ansiedade do amanhã
Eu tento ficar calada
Não pense em você
Não pense em nós
Não pense em mais nada
Essa noite, a gente dança até cansar

Esquece trabalho, filhos, planos
Casa, contas, profissão
Esquece carro, escola, livros
Calor, frio, confusão
Eu esqueço minha neura
Você esquece a solidão
Mais dois palhaços no salão

Quero que você seja feliz
Quero ser feliz também
Esquece o que passou, e o que virá
Esquece a dor, vem dançar

Friday, February 20, 2009

Meu blog querido, não te abandonei!

A sua frase foi um pouco difícil pra mim, Webelina. A uma porque as últimas duas semanas foram muito complicadas no trabalho. A duas porque essa frase foi algo naturalmente complexo pra mim.

É o tipo da frase que não me dizia algo instantâneamente. E nessas duas semanas (ou mais) pensando nela, não sobreveio nenhuma lembrança ou sentimento. Desta forma, recorri (mais uma vez) à abstração. Escrevi algo que eu imaginei, mas que não se refere a nada concreto.

Enfim,não abandonei meu querido blog e trarei novo post de carnaval.

Abraços!

frase da Webê:"O que eu sinto ao te ver é como sentir maus-presságios"

Não sei se era noite ou se era dia
Perdi a noção do tempo, do espaço.
Não havia música, nem harmonia
Só havia incerteza a cada passo.

Esse era o calabouço da tua convivência.
De dia: tua palavra fria.
E à noite,
Tua indecência.

Não sabia o que era paixão,
Pois isso me era tão raro...
Quando procurei já não havia razão
Você me prendeu no teu olho claro.

Te beijava e você não era minha
A cada lua nova eu era trocado.
Quando você voltava sentia frio na espinha
Como quem pressente um mau-presságio.

Mas ainda assim lhe era devotado
Ser iludido pelos teus lábios era minha sina.
Pobre de mim, fui derrotado
Pelos desejos daquela menina...

Tuesday, January 27, 2009

Frase do Manga: "A Razão Do Meu Silêncio"

Eu me lembro do tempo em que palavras importavam
Iam a ti como brisas
Entravam por teus ouvidos, suaves
Dissolvidas como perfume, absortas
Já existiam desde sempre
Eram tuas palavras, eu apenas fazia lembrá-las
Como se descobrisse em ti algo há muito escondido
Tu me ouvias como a um encantamento
Era tudo doce
Deveras interessante
Filtrado pelo teu interesse por mim
E o meu por ti
Não há porque falar agora
Não te atinjo mais, não me ouves
Não há doçura ou aroma
Não há mais nada
As agora flechas
Cegas, desnorteadas
Detém-se e vão-se ao chão
Não me entendes mais, e nem o quereres
E ainda não notas que mudaste!
Perguntas, atordoada, por que eu calo
És a razão do meu silêncio
Meu profundo desejo é fazer-te entender
Minhas mãos apertariam teus braços
Como se possuísse tua pele
Faria as palavras entrarem a ti, novamente
Mas meus brados não são – ou jamais serão – ouvidos por ti
Novamente
Pois tu fizeste meu som desaparecer
És tu que, enquanto falo, ouves somente meu silêncio
Então, por que falar?

Friday, January 23, 2009

Re: Time goes by so slowly for those who wait

Que coisa sacana é o tempo
passa rápido para quem não sabe o que fazer da vida
achando bem cômodo esperar o rumo se abrir à frente
e devagar para quem mal pode esperar para pôr as mãos no destino
levá-lo pelo caminho já cuidadosamente traçado.
Não consigo parar de admirar quem não tem medo de domar a vida
como quem doma um touro
Ele pode te derrubar, te levar pra um lado ou pro outro.
Mas fica lá, segurando o chifre,
fazendo parte, aguentando o tranco.
Tem gente que ia preferir esperar
o touro dormir...
Eu quero saber se é válido sentir culpa
por não aproveitar o tempo que já passou
(e não volta mais!),
se não tinha noção, naquele tempo,
de que estava perdendo tempo
que ia precisar bastante depois.
Agora que o tempo passou,
eu sei.
"Se soubesse ontem o que sei hoje..."
Tenho culpa no cartório, sr. Advogado?
Ou gostaria de me defender?
De agora em diante,
o jeito é não esquecer que o tempo passa.
Em vez de esquecer,
vou esperar ao lado da panela,
para demorar a passar...
e poder ver de perto
cada mililitro de água virar vapor.

Sunday, January 18, 2009

Eu e o Tempo

Desde pequeno eu tinha a percepção de que a passagem do tempo seria algo importante pra mim.Em parte porque eu tinha, de certa maneira, uma percepção diferente das crianças da minha idade. E em decorrência dessa percepção ouvi muita gente dizer que "você é bem maduro para a sua idade".

Quando era pequeno, sonhava em ser adulto. Eu não sabia exatamente o que queria fazer, apenas me via de terno, como alguém que é importante. Mesmo agora, já adulto, sonho em como será a minha vida daqui a alguns anos.

Mas, como eu ia dizendo, minha relação com o tempo não partiu somente dessa minha percepção diferente. Minha mãe, principalmente, me criou de forma um tanto quanto reclusa em alguns aspectos. Não reclamo de você, mãe: tua criação me deu tudo o que tenho e o que tenho não é pouca coisa. Porém, muitas vezes quando eu queria fazer alguma atividade que outras crianças como eu faziam era minha mãe quem dizia "você não tem idade", "só daqui há algum tempo"...

Imagino como isso deveria ter sido irônico para meu pai que, quando criança, passava mais tempo na rua do que em casa. Já para o filho, ele resolveu impor limites que nunca teve e como marinheiro de primeira viagem que era, errou e não foi só uma vez.

Quando eu vivia dessa forma, tudo que eu queria - lembro-me bem - era que o tempo passasse rápido. Nessa época, o tempo só tinha um significado: liberdade.

O tempo passou e eu terminei meus estudos básicos ingressando na faculdade de Direito em Niterói. Pra quem precisava de liberdade, estudar em outra cidade era o mesmo que soltar as amarras.

A faculdade de Direito trouxe o terno preto. Essa vestimenta, eu aprendi depois, serve não somente para identificar alguns operadores do Direito, mas também lhe servem de blindagem, de armadura. Espada e escudo para o guerreiro, terno e gravata para o advogado. (mas isso é para outro post)

Passei por períodos turbulentos. Fiz estágios em repartições públicas, num escritório de pequeno porte, aprendi muitas coisas e me aprimorei em outras. O tempo me deu saber e engrossou minha casca como um mestre prepara o pupilo para algo maior.

No meio disso tudo eu aprendi coisas sobre amor, amizade, lealdade, companheirismo. O tempo levou entes queridos e me deixou espaços vazios no coração que até hoje não foram preenchidos. “Te apresento a morte”, disse o Tempo e eu respondi dizendo “obrigado por ter adiado ao máximo esse momento”.

Depois de ter me ensinado as mais diversas lições, o Tempo achou que eu, finalmente, estava preparado. Quando chegou esse momento ele disse “preciso te mostrar um lugar. Não direi onde fica, nem quando. Tudo isso, meu caro, está a cargo do Destino”.
A primeira vez que vi o prédio em que trabalho eu estava do outro lado da rua, quando desci do ônibus. O edifício é o mais badalado da Avenida Rio Branco e em sua fachada HÁ UM IMENSO RELÓGIO.

Me senti como Roland finalmente de frente para a Torre Negra. Era mais do que algo convidativo, era como se aquela construção dissesse "bem-vindo ao lar".
Lá não era a casa do Tempo, pois esse não pára para descansar. Era como se fosse um templo em homenagem a Cronos, um lugar onde o Tempo é contemplado. Desde a primeira vez que pisei no 9º andar eu sabia que lá tinha algo pra mim.

Estavam lá meus maiores desafios, as mais incríveis aventuras e o conhecimento e a liberdade que eu tanto busquei.

O Tempo, ao que parece gostou de mim, resolveu que continuaria me guiando por esse mundo a fora. E, usando de sua típica ironia, meu deu um presente inusitado: “trabalharás com prazos para todo o sempre!”.

Thursday, January 8, 2009

Não nego que quero negar

Pode ser bem ruim confessar, mas o momento que estou vivendo não está me dando inspirações artísticas muito expressivas. Normalmente, a escrita é o meu refúgio primeiro. Isto aqui, um meio poderoso onde eu posso fazer o que quiser pra tirar tudo que há cá dentro. Só que o que está cá dentro não é fácil de expressar em palavras, faladas ou escritas, muito menos tem em si muita poesia. Esta, aliás, tem me deixado sozinha, substituída pela sua amiga Ironia algumas vezes. Nas outras vezes, maioria, é o Pessimismo que se faz de óculos pra que eu enxergue o mundo. Um pequeno passarinho carregando com dificuldade um Fandango é apenas um passarinho carregando um Fandango. Se eu parar para pensar na luta pela sobrevivência e a importância de viver pelas suas metas nesta vida, eu vou perceber que eu não tenho um Fandango pra carregar. Ou seja, tudo se resume ao que eu tenho feito em vez de escrever. Eu tenho passado grande parte do meu tempo deixando bem claro para o mundo que eu estou insatisfeita, apresentando um problema sério de concentração por causa desse pensamento. É sobre o que eu quero falar, o que eu quero escrever, o que eu reflito dia e noite. Acabo me colocando numa teia de auto-ajuda pública que em nada tem me ajudado. Os conselhos encontram o eco, sem virarem de fato uma mudança. Além disso, abordar sempre e sempre o mesmo assunto não ajuda a cicatrizar. Antes, deixa a ferida aberta e o fato fresco na memória, para acumular e desaguar a qualquer palavra dura ou momento de solidão.

- Oi, tudo bem?
- Não.
- O que houve?
- Eu só queria ser feliz...
- Você nem me perguntou.
- Eu não escuto sua voz.
- E por que isso acontece?
- Eu sei... eu sei...

Hoje arrependimento e vergonha se unem ao meu caldo. Enquanto o sol se põe e levanta, guerras começam, crianças nascem e outras morrem de fome, é em mim que eu penso somente. Meu egoísmo me constrange e isso nem me ajuda na produção. Ou vamos ficar produzindo meus problemas pra sempre, fazer um livro de como não se viver essa vida? Uhm... pelo menos vamos ganhar dinheiro!

Nesse momento eu não quero dar luz aos cegos que me cercam... Eu quero a luz para mim.

Thursday, January 1, 2009

Re: ensaio sobre a cegueira

Nos meus últimos escritos eu falei de algo que chamei de “amores possíveis”. Pra mim, amores possíveis são aqueles que, dentro das circunstâncias todas, podem se concretizar. É sobre concretude que eu quero falar hoje.
Sem pedir licença alguma, vou falar sobre a concretude de uma mulher. Mas, como sempre, a tratarei com carinho, respeito, dignidade e admiração – sempre admiração.

eu não sabia tu
não sabias
fazer girar a vida
com seu montão de estrelas e oceano
entrando-nos em ti
bela bela
mais que bela
mas como era o nome dela?
Não era Helena nem Vera
nem Nara nem Gabriela
nem Tereza nem Maria
Seu nome seu nome era...

(trecho de “Poema Sujo” – Ferreira Goulart)

Melhor que ver uma paisagem através de um quadro é estar lá. Acho que você concordaria, pois você já respirou outros ares muito mais vezes que eu e esteve em mais paisagens do que eu poderia contar.
De qualquer forma, algumas pessoas preferem o platonismo, o inalcançável. Algumas pessoas – acredito – preferem ver a paisagem no papel. Desta forma, ela sempre estará eternamente bela, será sempre uma ótima lembrança que se manterá inalterável independentemente da passagem do tempo.
Mas não é o que regularmente acontece...
A vontade de ser mais que uma bela paisagem é grande. E para que isso aconteça é necessário concretude. O que é vapor, precisa virar sólido. Um teorema precisa de demonstração!
Minha opinião: qualquer fantasma sucumbiria à vivacidade desses olhos azuis...São irresistíveis se forem usados com a devida munição.
Lembro-lhe que é necessário interagir com o ambiente. Tocá-lo, respirá-lo, bebê-lo, consumi-lo e até feri-lo, pois nada nesse mundo passa sem levar um arranhão sequer.
Mas tudo isso, eu sei, você já tem total ciência. Ainda assim, eu preferi te refrescar a memória.

Eu acredito em tudo,
Mas eu quero você agora.
Eu te amo pelas tuas faltas,
Pelo teu corpo marcado,
Pelas tuas cicatrizes,
Pelas tuas loucuras todas,
Minha vida.
Eu amo as tuas mãos,
Mesmo que por causa delas,
Eu não saiba o que fazer das minhas.
Amo o teu jogo triste.
As tuas roupas sujas,
É aqui em casa que eu lavo.
Eu amo a tua alegria,
Mesmo fora de si,
Eu te amo pela tua essência,
Até pelo que você podia ter sido,
Se a maré das circunstâncias,
Não tivesse te banhado nas águas do equívoco.

(trecho de “Quando o amor vacila” – autor desconhecido)

Conviver com alguém é um grande teste para o espírito. Somente na rotina é que aparecem os problemas, os defeitos, as decepções. Somente na rotina é que se estabelecem as maiores provas de amor.
Você sempre fala sobre portas. No seu caso, são portas que se fecham. Você não sabe como acontece, mas continua acontecendo. Você tenta evitar e eu acredito. Mas o resultado continua a se repetir...
Talvez seja a hora de mudar de estratégia. Contar com a persistência alheia não tem adiantado muito. Mas eu não te prescreveria nenhuma receita! Quem sou eu para fazer isso? Eu apenas cumpro a minha função de acreditar fielmente em você.
Apesar de entendê-la como alguém cuja arte se sobrepõe aos interesses mais mundanos, basta uma caminhada de 500 metros para estar em seu abraço. Você não é uma miragem pra mim, não é uma ilusão pra mim. Mas talvez, só talvez, eu tenho a visão aprimorada. Quem sabe minha íris é muito mais receptiva?! Ou meus sentidos sejam mais aguçados?
É por isso que ofereço minha parceria, minha energia: consigo enxergar algo além daquilo que meus olhos me permitem ver.

Eu quero ser possuída por você,
pelo seu corpo, pela sua proteção, pelo seu sangue.
Me ama.
Eu quero que você me ame,
E fique eternamente me amando dentro de mim,
Com a sua carne e o seu amor.
Eternamente, infinitamente dentro de mim,
Me envolvendo, me decifrando,
Me consumindo, me revelando

(trecho de “Eu queria ser possuída por você” – José Vicente)

Acredito que as necessidades do espírito se refletem na carne. Portanto, cuidar da carne também é preservar o espírito.
O beijo demorado dado na penumbra... O abraço aconchegante em forma de fortaleza... O prazer do sexo com quem se ama demais...
Portas que se exibem no corpo e que dão acesso ao espírito.
Se há algo de diferente em você eu diria que reside no fato de que é mais difícil enxergar as portas em você. Duas etapas são necessárias: primeiro enxergá-las e depois abri-las – ou passar quando já estiverem abertas!
Mas se poucos têm visão aguçada somente você poderia lhes ajudar a ver. Livre-os da cegueira, livre-os da ignorância. Faça-os enxergar o que estão perdendo. Pois, é justamente nesse momento que eles irão persistir.
Ligue o infravermelho.

Definição

Eu li, e reli, e reli. Fiz um exercício de interpretação. Fechei os olhos da modéstia, o charminho de quem não recebe muitos textos sobre si. E enxeguei. É, espertinho, você conseguiu. Sou eu.

Por muito tempo eu tenho tentado ligar os pontos, já tinha percebido essa minha caacterística espectral, que explica mas não justifica um monte de passagens da minha vida. Das mais antigas às mais novas. Acontece desde sempre. Impossível sou eu, e nem sei o porquê, o como, o que eu faço.

"(...) aquilo que se tem por uma bela paisagem: admiração, carinho, fascinação, vontade de preservar."


Eu tenho aprimorado a minha técnica de perceber alguns sinais. Um dia até fiz uma lista deles, de momentos esparsos que vivi em minha vida. São todos apenas migalhas, o máximo que eu conquistei. Acredito que tenham sido verdadeiras, que houve desejo, vontade. Mas isto passa. Desenvolvi a regra dos "20 segundos": todos um dia tiveram certeza que me queriam por 20 segundos. Eu consegui perceber, através de um olhar, uma palavra, um toque, um sorriso, ou até mesmo uma declaração explícita... Decerto foi um sentimento sincero mas que se esvai logo. Passou pela cabeça. Passou e foi. No dia seguinte, nenhum deles acorda pensando em mim. A vida segue e eles vão atrás de seus alguéns mais facéis, mais acessíveis, mais reais, menos etéreos.

Se eu, sem saber, fecho a porta, ninguém persiste a bater. O sentimento nunca vê a luz do dia, nunca desce à terra, não germina. Preferem deixar no fundo da alma, o lugar dos espíritos.

Por isso passei pela vida não sabendo se alguém me queria. Sem provas cabais que me fizessem acostumar com a idéia de ser desejada. "Era você. Eu gostava de você. Te admirava tanto. Tão inteligente, tão segura, independente..." Nada disso eu soube, nada disso eu ouvi quando precisava. Só descobri, anos depois, que muitos com quem convivi, até alguns dos que me tratavam tão mal, na verdade, gostavam de mim... Gostavam de mim? O quanto, buscando a outras? Sempre resisti a acreditar que era verdade. Além do mais, do que me adianta isso agora?

Por que nada disso viu a luz do dia?

"(...) pouco dela é matéria - enquanto que quase tudo é espectral!"

Uma sombra... tenho fama de muitas coisas, sem que ninguém, ou eu mesma, saiba direito quem eu sou e o que é verdade. Eu não sei como eu colaboro para que isso aconteça, só sei que preciso encontrar pessoas que me puxem pra terra firme, ou vou desaparecer de vez. Ou seria esse o meu devido destino? Inspirar admiração, mas nunca participação. Admiração, mas nunca compreensão. Carinho, mas nunca um toque que me alcance. Desejo, mas nunca uma atitude. Uma ótima idéia na teoria, inviável na prática.

Eu não sei onde estava o seu sentimento, já que nunca olhava pra mim. No início eu desviava os olhos de medo e confusão, mas depois fui atrás dessa expressão maior, que eu esperava muito receber. Mas não achei. Pouco a pouco, continuei buscando... onde estava? Nunca consegui descobrir. Da minha parte, confesso que não gostava de ver as fotografias. Me repeliam, não entendia muito bem. Eu as escondia, afastava-as de mim. Eu gostava era de te imaginar. E não mudava nada de como era, somente como agia. Mudava um pouco do roteiro a meu favor... Ainda guardava intacta na memória a visão do primeiro beijo, aproximando, aproximando. O que aconteceu depois virou um emaranhado confuso. A única outra visão lúcida que eu consegui guardar foi do dia que em que percebi que não havia nada em seu olhar, ou melhor, foi quando percebi que ele nem ao menos me buscava... Eu provavelmente já havia desaparecido.

Sinto que preciso ser vista e tocada. Mas algo me protege. O que é?