Wednesday, March 18, 2009

O Centro - parte I: não há santos lá

No meu entendimento, o centro da cidade é um lugar diferenciado.

Lá, pessoas fazem dinheiro, pedem dinheiro e roubam dinheiro. Todo tipo de homem você encontra lá: juiz, advogado, funcionário público, garçom, diretor da empresa, jornalista, policial, engraxate, charlatão, ladrão... O improvável encontro desses homens se dá no centro da cidade.

Lá existe uma bagunça organizada. Em todas as calçadas tem um camelô. Tudo você encontra, seja lá o que for. Uma pilha, uma puta, um jornal...”na minha mão é só um real”, eles dizem.

O lícito e o ilícito convivem tão juntos que já não se vê mais a linha divisória. Ela está gasta, apagada pela ação do tempo... E o mesmo serve para as pessoas: não há santos no centro da cidade. E isso, meus amigos, é questão de sobrevivência.

Saber por onde andar, com quem falar. Saber até onde ir e a profundidade que se pode chegar...Tudo isso se aprende com o tempo, é o normal. Mas se alguém perde essa imprescindível lição, a lei da selva se faz presente e o mais fraco é engolido pelos mais fortes. Sem pena, piedade ou cartão postal.

Também já não se vê linha divisória entre o certo e o errado nas pessoas que lá trabalham. Cada um faz o que tem que fazer. Trabalhar no centro é saber ser ambíguo, não se pode dar mole. Pois em cada esquina te espera uma armadilha, uma ilusão.

Mas o que eu realmente quero dizer aqui é que já não se sabe mais o que é real e o que é falsidade.

Alguém certamente vai lhe pedir dinheiro no centro. No meu caso, isso acontece todo santo dia. Talvez essa pessoa diga que mora fora do Rio de Janeiro e que precisa de dinheiro para a passagem de volta ou talvez ela diga que o dinheiro é para comida e esteja com um bebê no colo. As histórias são várias, mas não são infinitas e isso faz com que cada pessoa já tenha ouvida uma delas.

Minhas dúvidas aparecem quando penso que não tenho como saber se aquela pessoa realmente não vive no Rio de Janeiro e também não sei se o bebê da outra mulher é mesmo filho dela. Ora, é só andar no centro para ouvir o conto do vigário TODOS OS DIAS. Dia desses eu vi na TV que uma mulher usava o filho de outra para pedir dinheiro, pois essa era uma maneira de sensibilizar as pessoas....

Em quem confiar? Para se estabelecer uma relação de confiança com alguém levam-se anos e ali, naquele momento, essa pessoa quer que você acredite nela, que você sinta pena dela, que você seja generoso, altruísta e muitas vezes...cego.

Confesso que já não consigo mais ser cego no centro da cidade. Eu olhei nos olhos do mundo e não gostei do que vi. E essa visão fez de mim uma pessoa diferente e fez com que os meus olhos não fechassem mais. Ajudo quem eu conheço, certamente. Mas quando não reconheço a verdade crua, nua e brutal nos olhos de quem vem me pedir dinheiro, prefiro hesitar É como eu disse antes: não há santos no centro da cidade.

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